06/03/2020 às 14h20min - Atualizada em 06/03/2020 às 14h20min

Emir de Dubai mandou sequestrar duas filhas e ameaçar a mulher, conclui a Justiça britânica

De acordo com investigação, xeque exerceu campanha de pressão contra princesa; filha o classificou como 'a pessoa mais malvada que eu já conheci'

oglobo.globo.com - O Globo e agências internacionais
Princesa Haya, ao lado de Mohammed bin Rashid al-Maktoum, durante evento no Reino Unido Foto: Luke MacGregor / REUTERS / 17-06-2010
A Justiça britânica concluiu, nesta quarta-feira, que o emir de Dubai, o xeque Mohammed bin Rached al-Maktum, realizou uma "campanha de intimidação" contra uma de suas mulheres, a princesa Haya da Jordânia, e encomendou o sequestro de duas de suas filhas com outra mulher.
 
O xeque, que também é chefe de governo dos Emirados Árabes Unidos, tentava manter o julgamento secreto, mas a Justiça britânica decidiu que o caso célebre era de interesse público. Após meses de depoimentos, o tribunal determinou que o emir “não foi honesto”, mandou sequestrar duas de suas filhas de um outro casamento e intimidou Haya a ponto de fazê-la temer por sua própria segurança.
 
Em comunicado, o xeque disse que a Justiça britânica ouviu “apenas um lado da história”. Segundo al-Maktum, ele não pôde participar do processo de investigação, o que resultou em uma decisão parcial. Ele afirmou ainda que a decisão de conduzir o julgamento a portas abertas não protege seus filhos “da atenção midiática da mesma maneira que protege outras crianças de procedimentos legais que envolvem suas famílias no Reino Unido”.
 
Ex-amazona olímpica, a princesa Haya é meia-irmã do rei da Jordânia, Abdullah II, e se casou com o xeque em 2004, transformando-se na sexta e mais nova de suas mulheres. Juntos, tiveram dois filhos, que hoje têm 7 e 11 anos. A fuga da mulher para Londres com as crianças deixou seu irmão em posição delicada, dada a proximidade da Jordânia com os Emirados Árabes Unidos, fazendo com que também tentasse conter a repercussão do caso.
 
— Não consigo lidar com a ideia de que possa ser a última vez que vou vê-los [os filhos] se forem ver o pai. Não é seguro — disse a princesa durante sua breve presença no tribunal, em torno de dez minutos. — Não é apenas ele que me preocupa. São as pessoas ao seu redor. Sei como operam. Já vi acontecer com as irmãs deles e não posso encarar o fato de que possa acontecer a eles também.
 
O xeque pediu o divórcio de Haya, sob a lei islâmica, no dia 7 de fevereiro de 2019, vigésimo aniversário da morte do pai dela, o rei Hussein. Para isso, baseou-se num suposto caso entre a princesa e seu guarda-costas que teria ocorrido entre 2017 e 2018. Um mês depois da separação, no entanto, a campanha de perseguição começou a se intensificar: um helicóptero pousou na casa da princesa e o piloto disse que estava lá para levar um passageiro para uma prisão no deserto.
 
Nos meses que seguiram, ela começou a receber ameaças anônimas — "Nós vamos pegar seu filho. Sua filha é nossa. Sua vida acabou", afirmava uma delas — e disse, em duas ocasiões, ter achado armas carregadas em cima de sua cama. Em abril, a princesa decidiu fugir para o Reino Unido, levando consigo os dois filhos que teve com o emir.
 
Em junho, al-Maktum publicou um poema chamado "Você vive e morre", o que Haya disse ter sido uma ameaça direta a ela. Um dos versos dizia: "Vamos ver se o mau comportamento te traz benefícios. Eu não me importo se você viverá ou morrerá". Segundo a Justiça britânica, o xeque “agiu de maneira intimidadora e ameaçadora contra a mulher, e encorajou outros a fazerem isso sob suas ordens”, orquestrando até mesmo uma campanha midiática para difamá-la.
 
Sequestros
Durante o enfraquecimento de sua relação com o emir, Haya começou a duvidar dos argumentos de seu ex-marido para o desaparecimento de duas de suas filhas, Shamsa e Latifa. Filha do xeque com Huriah Ahmed, sua mulher argelina, Shamsa fugiu enquanto estava de férias com a família no Reino Unido, em 2000. O emir, então, ordenou que o telefone da jovem fosse grampeado e, sob suas ordens, ela foi raptada nas ruas de Cambridge e levada para uma propriedade de seu pai.
 
De lá, ela foi levada de helicóptero para a França e, depois, foi forçada a embarcar em um avião particular rumo a Dubai. Ela não foi vista em público desde então. À Justiça, Mohammed disse que Shamsa estava vulnerável e desaparecida e que ele e sua mulher foram procurá-la porque estavam preocupados.
 
A irmã mais nova de Shamsa, Latifa, tentou fugir de sua família pela primeira vez em 2002, aos 18 anos. Ela afirma que iria para Omã, mas foi reconhecida na fronteira e devolvida para sua casa. Em seguida, a mulher disse que ficou presa por mais de três anos, sendo vítima de tortura, espancada e posta em uma cela solitária sob ordens de seu pai. Após ser solta, ela afirmou que seus movimentos em Dubai foram limitados e seu passaporte, confiscado.
 
Em fevereiro de 2018, Latifa tentou escapar em um bote, mas foi encontrada pela guarda-costeira indiana a mais de 20 quilômetros das águas territoriais da Índia. Como estava em mares internacionais, no entanto, foi devolvida a Dubai.
 
— Eu estou fazendo este vídeo porque poderá ser o meu último, e se você o está vendo, não é por um motivo bom: ou eu estou morta, ou estou em uma situação muito, muito, muito ruim — disse em uma gravação de 45 minutos na qual descreve seu pai como “a pessoa mais malvada que eu já encontrei em minha vida”.

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