05/07/2017 às 14h27min - Atualizada em 05/07/2017 às 14h27min

“Entrei de cabeça na tristeza e lá fiquei por uns dois anos”, diz Taís Araújo sobre seu papel como Helena

Traumas, superação, racismo, aceitação: a atriz, estrela da capa da Marie Claire de julho, abre o coração para assuntos polêmicos de sua vida pessoal e se emociona ao falar de marido: “Passamos pelo quarto de empregada e Lázaro disse: ‘Eu saí daqui’. Meu coração ficou do tamanho de uma azeitona”

Emilia Kuster
Na pele dele
“Há várias passagens do livro do Lázaro [Na Minha Pele, Ed. Objetiva, 152 págs.] que me tocam muito. Quando ele fala da mãe, dona Célia, não me seguro [emociona-se]. Foi um pecado ela não ter visto o filho bem assim [chora]. Nunca imaginaria que o menino que vivia no aperto viraria um dos maiores atores do país. Eu tive uma família economicamente forte, pude tudo. Meu sonho era ser diplomata, o Lázaro, quando criança, nem devia saber o que era isso. Acho uma sacanagem a mãe dele não estar aqui para ver o que ele virou. Quando a gente comprou a casa onde moramos, ele fez questão que tivesse piscina. O sonho dele era esse, o meu não, porque tive uma e sei que quase não se usa. Construímos a piscina e reformamos a casa toda. Numa das visitas à obra, eu e ele passamos pelo quarto de empregada e ele me disse: ‘Eu saí daqui’. Meu coração ficou do tamanho de uma azeitona. É triste, mas é linda a história dele... Ele é lindo. Me apaixono todo dia.”
 
Os Traumas
“Minha mãe me obrigava a fazer três coisas que me traumatizaram quando criança e não fiz: nadar, tocar piano e falar francês. Então, em 2009, quando me separei do Lázaro [ficaram meses separados até reatar], decidi que ia resolver uma delas e me mandei para Paris para passar seis meses estudando. Vinte dias depois, me liga o Manoel Carlos oferecendo a Helena de Viver a Vida. Larguei tudo e voltei. Ou seja, não aprendi francês e ganhei outro trauma, a Helena [risos]. Não chegou a ser um trauma, mas é uma puta frustração. Era a primeira Helena negra das novelas e ela tinha que ser um arraso. Mas, dramaturgicamente, era fraca, sem conflitos, tinha a vida ganha. Se eu tivesse forças, teria a transformado numa vilã. Mas estava tão abalada com as críticas, tão frágil, que não tinha forças para pensar. Entrei de cabeça na tristeza e lá fiquei por uns dois anos. Pensei: ‘Minha carreira acabou’. No meu único dia de folga, estava tomando um sorvete e uma senhora virou e disse: ‘Posso te falar uma coisa? Quando falar algo na novela, pensa no que você está falando porque a gente não acredita no que você fala’. A mulher acabou comigo... Eu estava tão cagada que só consegui responder: ‘Pode deixar’. A novela das 8 é Copa do Mundo, né? Todo mundo acha que sabe fazer. Hoje, olhando com distanciamento, vejo que a Helena foi importante. Mudou minha vida. Me mostrou que tipo de atriz eu queria ser e que tipo de papéis não queria mais. Foi aí que comecei a produzir teatro, a buscar obras de muita qualidade artística.
 
Racismo
“Em 2015 [quando foi vítima de ataques racistas em seu Facebook], percebi que não podia mais aceitar o preconceito passivamente. Ao mesmo tempo, não queria me promover em cima do racismo. Então, optei por não dar entrevistas — o que me causou muita dor de cabeça — e fui à delegacia prestar queixa por injúria racial. Sofri muita pressão para falar sobre o assunto na época. Até do Jornal Nacional. Tive que implorar para que a Globo me resguardasse. Meu lugar não é na seção policial do noticiário e sim na de cultura. Quanto mais falasse sobre aquilo, mais voz daria aos racistas.”
 
Entre iguais
“O sistema de cotas é, em muitos casos, a melhor solução transitória para uma injustiça histórica. Meus filhos são negros e, por serem de elite, certamente conviverão muito mais com crianças brancas do que com negras. Quando eu era menina, sentia falta de estar entre iguais. Meu pai trabalhava numa empresa que construiu praticamente toda a Barra da Tijuca e pudemos comprar um apartamento lá por um preço bom. Antes disso, no Méier, a gente estudava em um colégio supertradicional. Eu olhava para o lado e ninguém se parecia comigo. Lázaro e eu pensamos em colocar os meninos na Eleva [escola recém-criada pelo empresário Jorge Paulo Lemann para ser “a melhor do Brasil”] porque, além de ensino de qualidade, tem uma cota alta de bolsistas. Para entender a diversidade, é preciso conviver com quem é igual e com quem é diferente. Ou viveremos num sistema de castas. O país só avança com mobilidade social, e o que dá mobilidade social é a educação.”
 
Cabelo, cabeleira
“Quando vivi a Alícia de A Favorita, tive que passar oito meses com uma peruca colada na cabeça. Foi uma tortura, mas me ajudou a fazer a transição capilar [quando quem tem cabelo crespo para de alisá-lo]. Desde então, jurei para mim mesma que nunca mais alisaria nem colocaria megahair. Assumir meus cachos foi mais do que uma questão estética. O Wilson [Eliodorio, cabeleireiro] foi determinante para isso. Me fez ver que meu cabelo era bonito. Foi: ‘Uau, essa sou eu de verdade’, e isso tem um valor gigantesco, redentor. Hoje ensino para a minha filha que o cabelo dela é lindo, assim enroladinho, e não deixo ninguém pôr a mão! Já o João adotou os dreads porque assim não tem que pentear [risos].”

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