15/01/2024 às 11h29min - Atualizada em 15/01/2024 às 11h29min

O tráfico de escravos e a diáspora africana que se desenvolveu entre os séculos XVI e XIX.

Por Isa Machado
A escravidão negra começou com o tráfico africano no século XV, por iniciativa dos portugueses (em 1444, estes começam a adquirir escravos negros no Sudão), com a exploração da costa da África e a colonização das Américas. Os demais impérios coloniais rapidamente aderiram à prática da compra e venda de seres humanos, estabelecendo comércio entre a África (captura de escravos) a América (venda e troca por matéria prima) e a Europa (para a venda das riquezas obtidas e a retomada do empreendimento, em futuras viagens).
A escravidão moderna, alicerce da colonização no Novo Mundo e do capitalismo mercantilista, foi um fenômeno absolutamente inédito no mundo conhecido por basear-se na conjunção indispensável de três componentes: a - baseava-se no fator racial, mesmo antes que o termo "raça" adquirisse um estatuto supostamente científico, em inícios do século XIX (escravizavam-se os negros africanos e seus descendentes enquanto que, na Antiguidade, a escravidão em geral havia resultado de outros fatores, como o não cumprimento de dívidas ou o resultado de guerras); b - a escravidão era hereditária, seguindo a linha matrilinear; c - a escravidão se dava por toda a vida (mais uma vez diferentemente da escravidão antiga, frequentemente temporária).
O apogeu do tráfico negreiro foi atingido no século XVIII, com a crescente demanda de produtos tropicais na Europa. Entre 1781 e 1790, importaram-se mais de 80.000 escravos por ano, estando envolvidos no tráfico ingleses, franceses, espanhóis, portugueses, holandeses e dinamarqueses. Foi também durante o século XVIII que surgiram coletivamente os primeiros abolicionistas, por motivos religiosos e humanitários (como entre os quakers), intelectuais (por influência do novo pensamento esclarecido do "Século das Luzes") e, sobretudo, porque a partir da Revolução Industrial e de suas fundamentais transformações na produção e no mercado de trabalho, a escravidão tornou-se obsoleta no mundo moderno ou que almejasse a modernização.
 O primeiro país a abolir a escravidão foi o Haiti em 1793. A maioria demorou para seguir o pioneiro, e fez suas abolições entre os anos 1830 e 1860. Os Estados Unidos, em 1865. Cuba, em 1886 e o Brasil em 1888.
 No Brasil a escravidão passou a ser utilizada na primeira metade do século XVI, devido à produção de açúcar. Os portugueses transportavam os negros oriundos da África para serem usados como mão-de-obra escrava nos moinhos de cana-de-açúcar do Nordeste.
Os africanos aprisionados pelos portugueses quando aqui chegavam eram cedidos por um determinado preço, como se fossem uma mercadoria qualquer. Os que tinham uma saúde mais perfeita chegavam a ser comercializados pelo dobro do valor em comparação aos velhos e fracos.
A travessia do continente africano para o Brasil era feita nos porões dos navios negreiros, com os negros empilhados da maneira mais insalubre e desumana possível, sendo que muitos deles nem sequer chegavam vivos, tendo seus corpos atirados ao mar.
Nas fazendas açucareiras os escravos trabalhavam de sol a sol, recebendo para vestir apenas um pedaço de pano ou qualquer peça de vestuário velha, dormiam nas senzalas, barracões escuros, úmidos e com quase nenhuma higiene, acorrentados para não fugirem.
Apesar das proibições, os negros, ocultamente, realizavam seus rituais e suas festas; foi neste período que se desenvolveu um tipo de luta que ficou muito conhecida aqui no Brasil: a capoeira. Eles também desenvolveram o candomblé, a umbanda, e outras religiões, nas quais ritos africanos eram mesclados a elementos do catolicismo, dando origem ao famoso sincretismo religioso brasileiro.
O negro não aceitou a escravidão pacificamente, as agitações ocorriam quase regularmente nas fazendas, escravos em bandos fugiam, criando nas florestas os célebres quilombos - lugares aonde habitavam apenas escravos fugitivos - ali viviam em liberdade para realizar seus rituais, suas festas e também para falar sua própria língua. O quilombo mais importante foi o de Palmares, cujo líder foi Zumbi.
O comércio de negros africanos como escravos foi uma das principais atividades comerciais dos países dominantes no período de 1501 a 1867.
A prática era gerenciada por seis nações: Inglaterra, Portugal, França, Espanha, Países Baixos e Dinamarca.
A justificativa comercial para sustentar a exploração de escravos africanos era que somente com os escravos seria possível manter os baixos preços de produtos como açúcar, arroz, café, anil, fumo, metais e pedras preciosas.
O tráfico negreiro foi responsável pelo deslocamento forçado de 12,5 milhões de pessoas da África e calcula-se que um terço foi para a América Portuguesa. Esse foi o maior deslocamento involuntário de pessoas durante toda a história.
Do total, 12,5% não conseguiram completar a travessia porque morriam ainda nos navios devido às más condições de higiene que permitiam a proliferação de doenças ou aos castigos aplicados para coibir revoltas.
Esta prática comercial da escravidão se constituiu no mais importante objetivo de interação entre europeus e africanos, antes afastados pelo poderio do mar.
A descoberta do Novo Mundo possibilitou a ampliação da produção de diversos produtos requisitados pela Europa, contudo, a mão de obra disponível era insuficiente.
Os escravos cativos foram transportados por diversas rotas saindo da África. Antes mesmo do início da exploração comercial em larga escala, havia rotas para a Europa pelas ilhas do Atlântico e Mar Mediterrâneo.
Estes teriam sido os primeiros a partirem forçosamente para a América para trabalhar nas plantações de açúcar.
Os portos que mais recebiam negros estavam localizados no Rio de Janeiro, em Salvador (BA) e Recife; na Inglaterra destacam-se Liverpool, Londres e Bristol. Na França, a cidade de Nantes era um importante local de venda de escravizados. Juntos, esses portos foram responsáveis por receber 71% dos escravos. Os principais pontos de partida na África estavam localizados em Senegâmbia, Serra Leoa, Costa do Barlavento, Costa do Ouro, Golfo do Benim e, principalmente, a África Centro-Ocidental.
O comércio Atlântico não era o único tráfico de escravos africanos. Já no século I d.C. eram trazidos escravizados pelo deserto do Saara, vindos da costa oriental africana.
Estes cativos tinham como destino a escravatura no norte da África, no Médio Oriente, para o qual seguiam viagem através do Oceano Índico.
A maioria deste comércio estava nas mãos de mercadores muçulmanos que abasteciam os reinos muçulmanos com escravos para os serviços domésticos e a concubinagem.
Os debates para o fim do tráfico negreiro começaram na Inglaterra, mesmo com os auspiciosos lucros da prática. Em 1807, o tráfico de negros foi considerado ilegal por ingleses e, no mesmo ano, pelo governo dos Estados Unidos.
No Brasil a lei n. 581, de 4 de setembro de 1850, conhecida como Lei Eusébio de Queirós, estabeleceu medidas para a repressão do tráfico de africanos no Império. Sua promulgação é relacionada, sobretudo, às pressões britânicas sobre o governo brasileiro para a extinção da escravidão no país.
diáspora africana caracterizada pela imigração forçada de homens e mulheres do continente africano para outras regiões do mundo é um  processo que foi marcado pelo fluxo de pessoas e culturas através do Oceano Atlântico e pelo encontro e pelas trocas de diversas sociedades e culturas, seja nos navios negreiros ou nos novos contextos que os sujeitos escravizados encontraram fora da África.
Para pensar a diáspora africana é preciso destacar as regiões portuárias. Tais regiões marcaram a entrada desses indivíduos em novos mundos, e por serem locais de chegada, eram também marcados pelo contato e pela mistura de diferentes realidades.
Os números são bastante relevantes nesse contexto. Foram aproximadamente doze milhões de africanos trazidos às Américas, e destes, 40% desembarcaram no Brasil, marcando a história do país pela diversidade cultural, étnica e social.
A imigração forçada é exemplo da violência e da exploração sistemática de homens e mulheres para sustentação de um regime escravocrata, do monopólio de cultivos como os do açúcar e da própria Coroa Portuguesa.
Assim, a diáspora não é apenas sinônimo da imigração à força, mas também uma redefinição identitária, ou seja, a construção de novas formas de ser, agir e pensar no mundo. Os castigos físicos e o sofrimento fizeram parte da vida de homens e mulheres escravizados. Mas as lutas diárias, os novos elos afetivos, os vínculos familiares também.
 

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